sábado, 3 de novembro de 2007

Texto referente a Arte. (Mary Ellen)

A Arteno Espaço Educativo

Raimundo Matos de Leão

"Precisamos levar a arte que hoje está circunscrita a um mundo socialmente limitado a se expandir, tornando-se patrimônio da maioria e elevando o nível de qualidade de vida da população."
Ana Mae Barbosa (1991: 6)
Para que esta afirmação se torne uma realidade, acreditamos que é através do espaço educativo que se possa efetivamente dar uma contribuição no sentido de possibilitar o acesso à arte a uma grande maioria de crianças e jovens. Sendo a escola o primeiro espaço formal onde se dá o desenvolvimento de cidadãos, nada melhor que por aí se dê o contato sistematizado com o universo artístico e suas linguagens: artes visuais, teatro, dança, música e literatura. Contudo, o que se percebe é que o ensino da arte está relegado ao segundo plano, ou é encarado como mera atividade de lazer e recreação. Desde o profissional contratado, muitas vezes tendo que lidar com os conteúdos das linguagens de forma polivalente, até o pequeno número de horas destinadas ao ensino das linguagens artísticas, a expansão de que nos fala a professora Ana Mae Barbosa se torna canhestra, quase sempre inexistente.

Ao longo dos anos, muito se tem falado e escrito sobre a necessidade da inclusão da arte na escola de forma mais efetiva. Desde 1971, pela Lei 5692, a disciplina Educação Artística torna-se parte dos currículos escolares. Muitas experiências têm acontecido, mas no contato direto com professores, diretores de escola e coordenadores pedagógicos, as intenções parecem apontar para um caminho interessante, mas é no confronto com a prática pedagógica no campo da arte que se nota a grande distância entre teoria e prática. Muitos equívocos são cometidos e a questão passa batida na maioria das vezes em que se questiona as vivências com a arte. Este quadro vem reforçar a postura inadequada de que o contato com o universo mágico da arte é importante, mas desnecessário. Esta contradição vem sendo objeto de reflexão e prática por parte dos arte-educadores, interessados em reverter a situação em favor de uma escola que valorize os aspectos educativos contidos no universo da arte. Daí a nossa preocupação com a formação de profissionais que vão exercer as funções na formação e orientação de crianças e de jovens. Diretores de escola, coordenadores e professores devem estar preparados para entender a arte como ramo do conhecimento em mesmo pé de igualdade que as outras disciplinas dos currículos escolares. Reconhecendo não só a necessidade da arte, mas a sua capacidade transformadora, os educadores estarão contribuindo para que o acesso a ela seja um direito do homem. Aceitar que o fazer artístico e a fruição estética contribuem para o desenvolvimento de crianças e de jovens é ter a certeza da capacidade que eles tem de ampliar o seu potencial cognitivo e assim conceber e olhar o mundo de modos diferentes. Esta postura deve estar internalizada nos educadores, a fim de que a prática pedagógica tenha coerência, possibilitando ao educando conhecer o seu repertório cultural e entrar em contato com outras referências, sem que haja a imposição de uma forma de conhecimento sobre outra, sem dicotomia entre reflexão e prática. O ensino da arte deve estar em consonância com a contemporaneidade. A sala de aula deve ser um espelho do atelier do artista ou do laboratório do cientista. Neles são desenvolvidas pesquisas, técnicas são criadas e recriadas, e o processo criador toma forma de maneira viva, dinâmica. A pesquisa e a construção do conhecimento é um valor tanto para o educador quanto para o educando, rompendo com a relação sujeito/objeto do ensino tradicional. Este processo poderá ser desafiador. Delimite-se o ponto de partida e o ponto de chegada será resultante da experimentação. Dessa forma, o ensino da arte estará intimamente ligado ao interesse de quem aprende. Esta maneira de propor o ensino da arte rompe barreiras de exclusão, visto que a prática educativa está embasada não no talento ou no dom, mas na capacidade de experienciar de cada um. Dessa forma, estimula-se os educandos a se arriscarem

a desenhar, representar, dançar, tocar, escrever, pois trata-se de uma vivência, e não de uma competição. Uma proposta em arte que parta deste princípio traz para as suas atividades um grande número de interessados. Estas crianças e estes jovens se reconhecerão como participantes e construtores de seus próprios caminhos e saberão avaliar de que forma se dão os atalhos, as vielas, as estradas. A arte fará parte de suas vidas e terá um sentido, deixando de ser aquela coisa incompreensível e elitista, distante de sua realidade. A concepção de arte no espaço implica numa expansão do conceito de cultura, ou seja, toda e qualquer produção e as maneiras de conceber e organizar a vida social são levadas em consideração. Cada grupo inserido nestes processos configura-se pelos seus valores e sentidos, e são atores na construção e transmissão dos mesmos. A cultura está em permanente transformação, ampliando-se e possibilitando ações que valorizam a produção e a transmissão do conhecimento. Cabe então negar a divisão entre teoria e prática, entre razão e percepção, ou seja, toda fragmentação ou compartimentalização da vivência e do conhecimento. Este processo pedagógico busca a dinâmica entre o sentir, o pensar e o agir. Promove a interação entre saber e prática relacionados à história, às sociedades e às culturas, possibilitando uma relação ensino/aprendizagem de forma efetiva, a partir de experiências vividas, múltiplas e diversas. Considera-se também nesta proposta a vertente lúdica como processo e resultado, como conteúdo e forma. É necessário que se pense o lúdico na sua essencialidade, conforme nos fala o professor Edmir Perroti:
"...gostaria de chamar a atenção para o conceito de lúdico. Sim, porque no mundo atual as diferentes dimensões do lúdico vêm sendo reduzidas a praticamente uma, a do lúdico instrumental. Esta que é, por exemplo utilizada pela publicidade, vem sendo tomada enquanto dimensão que dá conta das possibilidades todas do lúdico, como se este se esgotasse em tal perspectiva. Gostaria,assim, de lembrar aqui que o lúdico compreende pelo menos outra dimensão, que além de instrumental, o lúdico pode e deve ser essencial. No primeiro caso, o do lúdico instrumental, o jogo é compreendido enquanto recurso motivador, simples instrumento, meio para a realização de objetivos que podem ser educativos, publicitários ou de inúmeras naturezas. No segundo caso, brincar sob todas as formas físicas e/ou intelectuais, é visto como atitude essencial, como categoria que não necessita de uma justificativa externa, alheia a ela mesma para se validar. No primeiro caso, o que conta é a produtividade. No segundo, a produtividade é o próprio processo de brincar, uma vez nessa concepção jogar é intrinsecamente educativo, é essencial enquanto forma de humanização." (1995: 26-7)
De que forma a escola pode considerar na sua programação vivências onde o lúdico essencial esteja presente? Reconhecendo a arte como ramo do conhecimento, contendo em si um universo de componentes pedagógicos. Os educadores poderão abrir espaços para manifestações que possibilitam o trabalho com a diferença, o exercício da imaginação, a auto-expressão, a descoberta e a invenção, novas experiências perceptivas, experimentação da pluralidade, multiplicidade e diversidade de valores, sentido e intenções. Um programa educacional não pode tornar a arte num elemento decorativo e festeiro. A arte valoriza a organização do mundo da criança e do jovem, sua auto-compreensão, assim como o relacionamento com o outro e com o seu meio. Assim contextualizamos o trabalho na vertente do lúdico e do fazer, com a ação mais significante do que os resultados, ou seja, não se propõe atividades que não levam a nada. Se pensarmos num projeto e no seu processo, cada etapa apresentará resultados que poderá se tornar ou não um outro projeto. Os resultados dos processos podem ser uma etapa ou sua finalização em espetáculos teatrais, coreográficos, musicais, exposições, mostra, performances etc. .

A finalização desses trabalhos não deve ser a meta principal para a sua realização, e sim a pesquisa e o desenvolvimento do educando nas respectivas linguagens artísticas, o crescimento da sua autonomia e a capacidade inventiva. Por isso os projetos devem levar em conta os valores e sentidos do universo cultural das crianças e dos jovens, possibilitando a vivência com o repertório já existente, assim como sua ampliação e novas possibilidades de expressão. Entender e estimular o ensino da arte nesta perspectiva tornará a escola um espaço vivo, produtor de um conhecimento novo, revelador, que aponta para a transformação. Pensemos numa educação estética a partir das reflexões de João Francisco Duarte Jr.