segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Não peça pra sair, professor!

(Henrique César Montecino é publicitário e educador freireano)

Campinas, a “capital do interior”. Ex- Princesinha D´Oeste, pois até as andorinhas nos abandonaram com medo da violência, sub-produto da falta de educação vigente. 117 favelas; 189 escolas entre estaduais e municipais, fora as privadas; 3.789 professores; 16.500 alunos só no ensino fundamental; e 60 mil pessoas apinhocadas sem o básico da saúde, educação, lazer e cultura nas Glebas A e B do Pq. Oziel juntamente com Jardim Monte Cristo, configurando assim a maior ocupação sem teto da América latina. Sem contar todos os outros bairros periféricos.
Assim como no filme Tropa de Elite, esse é o retrato do cenário onde surge a figura do educador, este herói que sai de sua casa bem cedo para guerrear contra todos estes revezes cotidianos. Para ele a trincheira da luta está na sala de aula. Para a população está estampada cotidianamente no semáforo, à procura do próximo Rolex que “der sopa”. Nem precisa tanto. Como um aluno meu me disse, “fechou o vidro e trancou a porta é porque tem alguma coisa”.
Voltando ao guerreiro de jornada tripla para ganhar o razoável, vemos sempre a mesma história em nossos alunos. A desestruturação do núcleo familiar deles e que temos que remediar em sala de aula, pois é necessário aplicar o conteúdo da melhor forma possível.
Há os que comportam e absorvem. Porém, há os que entram 2 horas atrasados, falando alto e querendo montar um levante contra as nítidas precariedades que a sala de aula, pública ou não, oferece. Isso não [e só por causa do investimento, pois no curso de minha faculdade particular que financiei pela Caixa, vi muitos playboys fazê-lo, assim como meus meninos de risco. Para ser bem honesto, alguns playboys eram bem mais deseducados.
A questão mora no caráter formado até os 6 anos de idade em cada indivíduo. Eles não querem saber das boas intenções do governo. Não tem paciência parta isso. E muitas vezes eles nem sabem o que querem. Outra fase de aluna sobre uma ONG muito bem estruturada. Pergunto eu: - Mas lá não tem lanche legal, a assistente não é educada e cordial contigo? Resposta: É professor, mas eu não sei... não gosto daquele lugar.
Que lugar nossos jovens de risco social estão gostando mais hoje, então? Ora, basta ver a aglomeração que cerca o “pancadão” na Gleba B do Oziel e no Campo Belo e a Biblioteca Municipal. Onde será que ela acharia “mais legal”, num país de botecos lotados e bibliotecas vazias?
Enquanto isso, lá está nosso guerreiro, diferente do Capitão Nascimento, sem AR-15 e sua fúria, mas com um giz na mão, uma lousa razoável como a situação da Educação no País e procurando ter amor, diálogo, carinho e paciência até onde o limite da hombridade lhe permite. Pois há também os alunos que só querem saber de arruaça, quando não do lanche e da bolsa-ajuda, quando há alguma.
Através do diálogo, é papel mais que obrigatório, como manda Paulo Freire, “mergulhar na realidade” do aluno para sanar esta mentalidade através do carinho. Contudo, nem sempre o aluno, além de não permitir, quer montar milícias contra o educador.
O educador não pode se mostrar educado, nem tão pouco com medo. Sua profissão é justa, ele antes de tudo é um obstinado pela justiça social, pois se assim não fosse, não colocaria o pé para fora de casa. (...) Às vezes, esse herói passa por situações vexatórias como que passei: - Professor, você é otário em estar aqui, eu em dia de “avião” na “biqueira” ganho o dobro que você tira aqui... Com todo respeito professor, tu é mané pra k...
Sendo assim, educador, herói do cotidiano, seja firme e tenaz na sua justa conduta, pois os bons meninos (as) irão se espelhar em você e Paulo Freire de algum lugar nos irá abençoar. Até a barba de Santo ele tinha. Use da mesma malandragem hoje solta na periferia, para mostrar que há ali conhecimento que pode mudar o rumo daquelas vidas.
Faça como Mano Brown, pois do mesmo jeito que “safado” não atravessa a porta da cadeia, da minha sala de aula também não. Existem momentos que Piaget, Vigotsiki, Lacan e tantos outros tem que ficar a margem do processo educacional e você então utilizar seu próprio método.
O processo formal nos coloca em formas, em formol. E se está no formol, está morto.
Eles têm que saber que direitos vêm depois de deveres bem cumpridos. Honestidade, trabalho e pontualidade não podem se dobrar ao vandalismo, pois corre o risco da educação tornar-se algo que se arranhou por si, envolvendo pessoas e ONGs sérias pelo país, como Pe. Lancelotti, para citar apenas um exemplo entre tantos. Não estamos precisando de cadeiras para ficar sentados, GT´S e planejamentos. Estamos precisando de ação palpável e concreta. Sem proselitismo.
Por conta desses valores, quase fui alvo de um B. O. Estamos em uma Pátria onde o Educador pra Delegacia e Renan Calheiros é absolvido. Onde presidente e ex-presidente erram no português ao se criticarem mutuamente por conta da educação. Tem alguma coisa fora do lugar, creio.
Usaria Che para finalizar o real momento da educação na periferia campineira, pois quem sabe assim alcançaremos as 5 premissas do grupo recém montado.
- Hay que endurecer, pero que perder la ternura, jamás.